quarta-feira, 21 de maio de 2014

SOMENTE SÓ





Era uma vez um menino. Um menino frágil, magro, desamparado, carente, abandonado pela mãe, maltratado pelo pai, criado pelo vento. 

Um dia esse menino cansou de esperar e procurou, procurou, procurou. Perdeu-se e ganhou a vida, nos trilhos de uma louca-motiva-ação.

Ele aprendeu que na vida os incêndios são obras do inimigo, e precisam ser apagados. E que fogo com fogo se paga.

Aprendeu a fazer fogueiras, a transformar faíscas em labaredas, e labaredas no mais forte inferno.

Cercou-se de demônios que pudessem conduzi-lo ao céu. E com seu exército de anjos decaídos, seguiu sua jornada às nuvens. 

Trocou os trilhos por asas, e, vendo o mundo de cima, percebeu que não queria mais voltar a pôr os pés no chão. Perder-se em meio aos demais.

Aliou-se a outros incendiários, estes mais espertos e experientes. Mas deixou-se levar por sua vaidade e, cego ao que não queria ver, viu-se sem o tapete embaixo de seus pés.

Perdeu seu trono. Entretanto, não podendo mais suportar o chão, o "em meio aos demais", segue até hoje gastando todas as suas forças pulando, pulando, pulando, tentado voltar aos quentes jardins de onde caiu. Trocar tapinhas nas costas e intrigas com seus agora irmãos de fogo, que o odeiam.

Persona non grata no céu e no inferno.

Sua infância se foi. Sua adolescência se foi. Sua vida adulta. Sua velhice. Seus cabelos brancos. Seu amor. Seu coração. 

E de tudo só resta um peito vazio, sem honra, sem respeito, sem carinho, sem dignidade, sem paz.

e só.

Somente só.

*Edson Travassos Vidigal é advogado membro da Comissão de Assuntos Legislativos da OAB-DF, professor universitário de Direito e Filosofia, músico e escritor. Especialista em Direito Eleitoral e Filosofia Política, foi servidor concursado do TSE por 19 anos. Assina a coluna A CIDADE NÃO PARA, publicada no JORNAL PEQUENO todas as segundas-feiras.

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