sábado, 2 de janeiro de 2016

Marx comprou o diploma?


Por Edson Vidigal *



Na capa da Folha de São Paulo do último domingo, uma chamada atraiu minha atenção: “Marx virou doutor em escola que era fábrica de diploma, revela livro”

Na matéria respectiva, no caderno “ilustríssima”, li sobre o livro “Amor e capital”, da americana Mary Gabriel, obra na qual a autora, ex-jornalista da agência de notícias Reuters, brinda seus leitores com curiosidades da vida de Karl Marx, como o lento processo de maturação de suas ideias junto a seu companheiro Engels, sua vida familiar, os acontecimentos políticos que marcaram a época, e, também, o objeto da chamada que me fisgou a atenção.

Segundo a autora, a célebre tese de doutorado escrita por Marx sobre Demócrito e Epicuro foi aprensentada à Universidade de Jena, da Alemanha do século XIX. Porém, o que poucos sabem (ou sabiam, até agora), é que esta universidade era uma “verdadeira fábrica de diplomas por correspondência” (nas palavras da autora), e que Marx foi aprovado no prazo de uma semana, sem nunca ter passado por banca examinadora. (!?!?!!)

Pretendo adquirir o livro, que dentre outras “revelações”, mostra um Marx irresponsável para com as finanças (suas, do pai e do amigo Engels), constantemente devedor, sempre à busca de dinheiro emprestado, e um fato de que eu desconhecia, o de que Engels foi um industrial.

Mas aqui o que me interessa mesmo é uma ponderação acerca da atual situação que se encontra o ensino brasileiro, principalmente nesses tempos de governo pseudo-marxista. Nunca antes da história desse país ensino e educação foram tão sinônimos de comércio de diplomas. Isso é fato, incontestável. Só não vê quem não quer.

Não obstante a educação ser função básica do Estado, e em meu entender absolutamente necessária para o funcionamento de uma democracia, e mesmo de qualquer sociedade, a educação em nosso país foi arrendada a grupos empresariais como produto igual a qualquer outro - sabão, batata-frita, saco de lixo, botox etc. - e nossas crianças, jovens, e adultos, entregues à própria sorte.

Sabiam que apenas dois grupos empresariais dominam praticamente todo o “mercado” de educação do país? Recentemente a fusão entre o Kroton e a Anhanguera criou uma hegemonia que dita os critérios de educação no país mais que o próprio MEC, que, diga-se de passagem, de muito tempo pra cá não passa de um deseducador da nação, servindo a interesses pessoais de políticos empresários da educação, e a interesses ideológicos dos atuais governos.

Professores, coordenadores, pedagogos, todos são obrigados a se curvar a políticas educacionais que têm como objetivo o lucro financeiro dos fundos de investimento que controlam as instituições de ensino, e passam longe de qualquer comprometimento com educação.

Os professores atualmente valorizados são os que aceitam receber menos, ter inúmeras turmas, lecionar qualquer matéria, mesmo as na que não têm experiência, ou mesmo nas que não têm nem habilitação para tal, e principalmente os professores que não fazem muita questão de lutar por qualidade na educação.

A meta das instituições de ensino não é ensinar, é aprovar. Quando se reprova, o aluno desiste, e deixa de pagar mensalidade. Por isso, o ensino é nivelado por baixo, e o professor tem por meta a aprovação dos alunos, e o fluxo contínuo de caixa.

Em nosso país, educação deixou de ser serviço e passou a ser produto. Não se paga mais para que ter acesso a conteúdos, para aprender a lidar com problemas da vida, para ser treinado e testado para o desempenho de uma profissão, de uma exercício de cidadania. Agora se paga por um diploma, em prestações fixas (60 no caso das universidades).

Leiam algumas palavras do novo reitor da UFRJ, Roberto Leher, acerca do mecanismo pelo qual a mercantilização da educação funciona no país, sob controle de fundos de investimento e “empresas de educação”:

“O negócio do investidor não é propriamente a educação, é o fundo. Ele investiu no fundo e quer resposta do fundo, que cria mecanismos para que os lucros dos setores que eles estão fazendo as aquisições e fusões sejam lucros exorbitantes. É isso que valoriza o fundo. A racionalidade com que é organizada as universidades sob controle dos fundos é uma racionalidade das finanças. São gestores de finanças, não são administrados educacionais. São operadores do mercado financeiro que estão controlando as organizações educacionais.

Toda parte educacional responde uma lógica dos grupos econômicos, e por isso eles fazem articulações com editoras, com softwares, hardwares, computadores, tablets; é um conglomerado que vai redefinindo a formação de milhões de jovens. No caso do Brasil, cinco fundos têm atualmente cerca de 40% das matrículas da educação superior brasileira, e três fundos têm quase 60% da educação à distância no Brasil.”

A situação é preocupante. Sem educação, não existe nação, não existe progresso, não existe sociedade. Nossa educação virou um engodo. Nossas políticas públicas das últimas décadas foram e são grandes engodos. O país vai parar se continuar do jeito que vai. Não produzimos nada, vivemos da dependência de capital especulativo, do entra e sai de dinheiro de “investidores” que não estão nem um pouco preocupados com o progresso do país e dos brasileiros, mas apenas em lucrar. Não há nada pior do que quando os que se dizem comunistas alcançam e se mantêm no poder por meio das práticas capitalistas que condenam. No fim, parece que Marx realmente comprou o diploma...



#‎juntossomosmuitos‬. É pra avançar!

* Edson José Travassos Vidigal foi candidato a deputado estadual nas últimas eleições e por convicção política, de forma intransigente, não aceitou doações de empresas. É advogado membro da Comissão de Assuntos Legislativos da OAB-DF, professor universitário de Direito e Filosofia, músico e escritor. Especialista em Direito Eleitoral e Filosofia Política, foi servidor concursado do TSE por 19 anos. Assina a coluna A CIDADE NÃO PARA, publicada no JORNAL PEQUENO todas as segundas-feiras.

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