terça-feira, 17 de setembro de 2013

DIPLOMA EM 60 PRESTAÇÕES

Por Edson Travassos Vidigal*

Esta semana, infelizmente, ouvi de um aluno, com profunda tristeza e indignação, que este estava pagando por um produto: o conhecimento. Algo dito em alto e bom tom, com absoluta convicção.

Fico muito triste pela mentalidade que restou consagrada nos bancos acadêmicos de um tempo onde se pensa que o conhecimento é um produto, e que este pode ser comprado. 

Na verdade, há muito, muito tempo atrás, em uma galáxia muito, muito distante, esta quase poderia ter sido uma máxima sofista. Foram os sofistas gregos que advogaram ser o conhecimento nada mais que a arte de convencer, a exemplo de Protágoras, que dizia ser o homem a medida de todas as coisas. Eles foram os primeiros professores profissionais da História ocidental, pois cobravam para ensinar tal arte. Mas mesmo eles não vendiam conhecimento. (Platão em alguns de seus diálogos iria além na polêmica aqui tratada, questionando: A verdade pode ser ensinada?)

Por mais que não concorde com tal visão sofística do conhecimento, acrescento que a sofística daquele tempo era feita com argumentos válidos, frutos de profunda reflexão e de árduo trabalho de pesquisa, de leitura, de pensamento, de discussões dialéticas e de construção de conhecimento. De preparo e dedicação a uma causa na qual acreditavam. 

Muito pior que aquela, a nova sofística é oca, vazia de tudo, alienada, desprovida de razão, de estudo, de preparo. Desprovida de conteúdo e, principalmente, de valores. 

Uma sofística que acredita que tudo pode ser vendido, ou comprado.

Cabe ponderar que o conhecimento não é algo independente do sujeito. Não se pode simplesmente abrir uma embalagem bem transada de conhecimento e ingeri-lo aos goles. Ainda não inventaram a pílula do conhecimento.

O conhecimento não se vende, não se compra. Não é produto alienável.

É fruto de uma relação entre um sujeito que quer conhecer e um objeto que pode (ou não) ser conhecido.

Nenhum professor, nem ninguém, consegue abrir a cabeça de um aluno e enfiar nela conhecimento. Nenhuma faculdade consegue isso, e nenhuma faculdade pode vender um produto chamado conhecimento.

As instituições de ensino vendem, sim, um serviço. O serviço de propiciar aos alunos o contato com o conhecimento produzido por outros. O serviço de tentar expô-los a métodos que podem levar o próprio aluno a encontrar o seu conhecimento. Ou, como entendo, que possa levá-lo a construir o seu conhecimento.

O processo de construção de conhecimento é árduo, cansativo, difícil, lento e arriscado. E o pior de tudo é que ninguém pode trilhar esse caminho pelo aluno. O máximo que se pode fazer é pegá-lo pela mão e conduzi-lo por entre as veredas do conhecimento, por caminhos que você já seguiu e que já conhece um pouco mais que ele.

Poucos alunos atualmente estão dispostos a seguir por este caminho na busca de construírem o seu conhecimento. A grande maioria prefere acreditar que simplesmente se pode pagar por um produto. 

E isso tudo em apenas 60 prestações.

A pior mentira é aquela que contamos a nós mesmos...


* Edson Travassos Vidigal é advogado, professor universitário de Direito e Filosofia, músico e escritor. Assina a coluna A CIDADE NÃO PARA, publicada no JORNAL PEQUENO todas as segundas-feiras.

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e-mail: edsontravassosvidigal@gmail.com
Blog: edsontravassosvidigal.blogspot.com.br

2 comentários:

  1. Como professor compartilho da mesma indignação, porém a postura mercantil de muitas IES contribuem para a ratificação deste conceito entre os discentes, principalmente pelas frouxas regras referentes à pesquisa e extensão que impõem às faculdades.
    Algumas IES assumem sem lado mercantil "descaradamente", recentemente conversando com um gestor de uma, ele me confidenciou que havia participado recentemente de um encontro para específico para profissionais da área, e o mesmo me confidenciou sua indignação a ouvir de um palestrante que não havia viabilidade na manutenção de um centro universitário e muito menos de uma universidade, em função das exigências do MEC...

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    1. Concordo plenamente. É uma vergonha. Uma total falta de comprometimento com a educação. Uma total falta de vocação docente. Mas acredito que o tempo irá cuidar disso, e as IES irresponsáveis pagarão o preço. Pena que até lá muitos alunos serão lesados.

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